Donos de imóveis que exploram o bem alugando-o em sites de hospedagem têm conseguido decisões favoráveis no Tribunal de Justiça de São Paulo para continuar com os negócios mesmo sem o aval do condomínio. A disputa tem se dado porque vizinhos reclamam que a alta rotatividade de pessoas no condomínio altera a rotina, o sossego e a segurança do local.
Na Subseção de Direito Privado III do tribunal, competente para julgar direito de vizinhança, tem prevalecido o entendimento de que, na falta de disposição específica na convenção de condomínio, não é legítima a proibição a proprietários de locar suas unidades por curta duração, ainda que definida por maioria assemblear.
A 36ª Câmara de Direito Privado, por exemplo, entende que a ocupação do imóvel por pessoas distintas, em espaços curtos de tempo, via Airbnb, não descaracteriza a destinação residencial do condomínio.
Na 28ª Câmara, da mesma forma, prevalece que se a convenção do condomìnio não estabelece limitações à locação, há necessidade de observância de quorum qualificado para alteração, previsto no artigo 1.351, do Código Civil.
“Ainda que o imóvel possua decoração singela e impessoal e que exista anúncio na internet sobre a vaga em quarto, do apartamento mobiliado, a locação de imóveis por curta duração, repita-se, não descaracteriza a finalidade de moradia do apartamento”, afirmou o desembargador Milton Paulo de Carvalho, da 36ª Câmara.
Ele cita precedente da 38ª Câmara Extraordinária da Direito Privado em que participou como julgador, que assentou que a locação por curto espaço de tempo não difere daquela temporalmente estendida, pois, em ambos os casos, o locador aufere renda com seu imóvel, sem que isso desnature a utilização da unidade em si, que continua sendo destinada para fins residenciais.
“A interpretação pretendida pelo condomínio implicaria vedar qualquer tipo de locação no imóvel, seja ela por um ano ou por trinta meses, seja por um dia ou um feriado. A alteração do lapso temporal, por si só, é incapaz de tornar distinta a forma de destinação do imóvel”, concluiu o relator, desembargador Hugo Crepaldi, que entendeu descabido considerar a locação por curta temporada como um contrato de hospedagem.
“Inexistindo vedação na convenção do condomínio e não sendo possível se afirmar que a locação por curta temporada altera a destinação de modo a qualificá-la como não residencial, inexiste base jurídica a sustentar a pretendida restrição do direito de propriedade da ré pelo condomínio”, complementou o desembargador.
Responsabilidade solidária
Outra controvérsia que também tem sido solucionada pelo tribunal é quando viajantes encontram problemas nos locais em que se hospedam. A corte vem entendendo que os sites de hospedagem não são meras plataformas intermediárias e que respondem quando há defeito na prestação do serviço por quem alugar o imóvel.
Em um caso julgado pela 30ª Câmara, em julho de 2018, uma mulher que contratou hospedagem em Genebra, na Suíça, recebeu diversas picadas de percevejos presentes no imóvel e teve de desistir da estada até o final contratado, tendo optado por se hospedar em um hotel. Chegou a alegar que teve que arcar com despesas médicas, medicamentos e a necessidade de compra de malas novas.
Relator do caso, o desembargador Lino Machado afirmou que não há dúvida de que o nome Airbnb é conhecido mundialmente e que, em geral, os usuários relatam que o serviço prestado é de qualidade. “Todavia, isso, por si só, não garante que o serviço será sempre cem por cento perfeito”, ponderou.
Machado entendeu que ainda que o Airbnb não seja o efetivo anfitrião ou locador dos imóveis oferecidos, é dessa empresa que o consumidor busca a prestação do serviço que lhe garanta uma hospedagem tranquila, no local ali divulgado, pelo preço previamente ajustado, e com a garantia da empresa de que o consumidor não está sendo vítima de uma fraude ao aceitar se hospedar em um imóvel indicado na plataforma. Logo, a Airbnb responde por eventuais danos causados aos consumidores, disse.
“Incumbia à ré, ou a seus prepostos, verificar o que estava acontecendo e tomar, prontamente, as atitudes cabíveis. O dano moral é evidente. A consumidora contratou os serviços da ré visando a não ter problemas em sua viagem ao exterior. Não houve razoável atendimento à consumidora na busca pela solução do problema que ela encontrou durante a estadia. Isso, por si só, é situação passível de indenização”, mantendo o fixado na sentença, em R$ 6 mil. Quanto à restituição da quantia paga, entendeu razoável o abatimento proporcional do preço, e o reembolso pelo que foi gasto com o hotel.
Em 2017, decisão da juíza Maria Fernanda Belli, da 25ª Vara Cível de São Paulo, também condenou o mesmo site a indenizar em R$ 17 mil um casal brasileiro que alugou um apartamento na África do Sul, mas só no desembarque ficou sabendo do cancelamento. O entendimento também foi de que os sites especializados em intermediar a reserva e o pagamento de hospedagem respondem por falhas no serviço ao consumidor, pois o cliente tem confiança na ferramenta justamente para evitar quaisquer transtornos na viagem.
1065850-40.2017.8.26.0114
1021565-70.2018.8.26.0002
1009601-48.2016.8.26.0100
1009888- 93.2017.8.26.0320